segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Milagre de Mão-Dupla


“E Jesus, falando, disse-lhe: Que queres que te faça? E o cego lhe disse: Mestre, que eu tenha vista. E Jesus lhe disse: Vai, a tua fé te salvou. E logo viu, e seguiu a Jesus pelo caminho.” Marcos 10:51-52

Existem várias definições de milagre, mas se eu pudesse eleger uma, eu diria que milagre é a potente ação de Deus diante de nossas impotências. O milagre chama à atenção para Deus, para a dispensação de seu favor. Mas o que normalmente não se percebe, quando se busca o milagre, é que todo milagre é de mão-dupla, ou seja, envolve Deus e o homem. O milagre não anula o homem, apenas o põe no seu lugar, pois somos por natureza marcados por muitos limites e fragilidades. Se de um lado existe um Deus que deseja nos alcançar com sua graça, do outro lado faz-se necessário que exista um homem que queira ser alcançado e esteja engajado com Deus no milagre. Bartimeu era cego e é obvio que tudo o que ele queria era enxergar, mas Jesus lhe pergunta: “Que queres que te faça?”, em outras palavras, Cristo estava dizendo que o milagre passava por Bartimeu e o envolvia diretamente no processo, sem anulá-lo. Alguns poderiam afirmar que a pergunta feita ao cego foi desnecessária, pois o Senhor que sonda o coração, sabia o que Bartimeu procurava. No entanto, a pergunta não era para desvendar o desejo do coração desse homem, mas muito além, para envolvê-lo no milagre. Nossas escolhas, definem se Deus entre ou fica de fora. Deus não vai curar algo que não lhe entregamos, pois o milagre está no caminho da rendição, da entrega. Ao declarar: “que eu tenha vista”, Bartimeu estava afirmando que era impotente para resolver sua demanda, mas que reconhecia em Cristo, esse poder que lhe faltava. Se o milagre é de mão-dupla e a parte de Deus é realizar o impossível, certamente a nossa parte é a entrega. Parece simples, mas a entrega é um dos maiores desafios no caminho do milagre, uma vez que somos tendenciosos a ficarmos agarrados ao problema, e travarmos lutas horríveis dentro de nós. Como diz o Senhor: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus” (Salmos 46:10), parem de lutar dentro de vocês, como se tudo dependesse disso. Deus deseja cuidar de você, mas é preciso rendição: “Entrega o teu caminho ao SENHOR; confia nele, e ele o fará.” (Salmos 37:5)

Pr. Hilquias Fábio


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

“Da Minha Vida Cuido Eu”


“Convém também que tenha bom testemunho dos que estão de fora, para que não caia em afronta, e no laço do diabo.” 1 Timóteo 3:7

A destituição gradativa e sutil das figuras de autoridade em nossa sociedade tem provocado o desaparecimento da salutar prestação de contas. Se em um primeiro momento tínhamos “senhores” e a estes devíamos submissão, obediência e transparência; nesse momento, o que temos como valor balizador das relações é a autogestão da vida, pois nos tornamos senhores de nós mesmos e afirmamos, como homens livres que acreditamos ser: “da minha vida cuido eu”. Não admitimos mais que nossas escolhas, postura diante da vida, valores, crenças sejam julgados ou sujeitos às opiniões alheias. Se “a vida é minha” e “dela cuido eu”, logo surge como valor implícito, a dificuldade em me perceber como parte de um grupo, pois a única ótica possível é a da vida não tutelada, mas livre de amarras e julgamentos. Fazendo uso de um pensamento de Lévi-Strauss: “O Ego humano nunca é autônomo, não existe um “Eu” que seja parte de um “Nós” e, de fato, todo e qualquer “Eu” é um membro de muitos “Nós”. Em outras palavras, só existimos no encontro com a coletividade e alienar-se desta realidade é se desumanizar. O que tudo isso tem haver com o conselho do apóstolo Paulo à Timóteo? Eu digo que tem tudo haver, pois o desafio de ter um bom testemunho para os de fora, significa afirmar que a opinião daqueles que me cercam é importante, ou mesmo, indispensável para a fé cristã e isso tem a implicação direta de prestação de contas do que faço. O meu testemunho é um grande divisor de águas entre ser um instrumento de salvação ou escândalo (e consequentemente perdição). Cristo não é conhecido por meio de discursos inteligentes ou oratórias eloquentes, mas pelo o que Ele é em nós, por sua vida e manifestação em nós e disso temos que testemunhar. Estamos sujeitos a muitos olhares, a observações cuidadosas e uma expectativa de Deus a nosso respeito é que, olhando para nós, o mundo possa ver seu Filho Jesus Cristo. Isso não quer dizer que somos cativos da reputação ou da opinião alheia, mas que a consideramos; e que sobretudo nos importamos com a opinião de Deus a nosso respeito. O que sou diante de Deus, tem implicação direta na minha vida publica, logo, no meu testemunho. Não somos livres para fazermos da vida o que bem entendermos, pois não nos pertencemos a nós mesmos, pois “por bom preço fomos comprados”  (1 Coríntios 7:23ª). Somos de Jesus, logo não somos senhores de nós mesmos, mas escravos da graça de Deus, convocados à testemunhar. Como discípulos de Cristo, somos desafiados a abdicarmos de nossa  vontade imperfeita e acatar a vontade de Deus, absoluta e perfeita. O verdadeiro discípulo, é aquele que devolve a Deus toda a sua liberdade e vive não mais ele, mas Cristo nele. Da nossa vida cuida Deus!

Pr. Hilquias Fábio

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Espiritualidade de Corpo e Alma



“Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele e, vendo-o, moveu-se de íntima compaixão; e, aproximando-se, atou-lhe as feridas, deitando-lhes azeite e vinho; e, pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para uma estalagem, e cuidou dele” Lucas 10:33,34

     Uma das grandes denúncias contra a religião foca no seu poder de produzir pessoas alienadas. Mas o que é um alienado? O alienado é o sujeito que sem perceber transfere o domínio de si a outros e abre mão da razão, da capacidade de questionamento, de julgamento. De forma mais específica, a alienação religiosa transforma os sujeitos, em sujeitos improdutivos e desvinculados da realidade que o rodeia; focando apenas no transcendente, na fé abstrata, no “divino” que exige exclusividade, roubando-lhe o privilégio de envolver-se com os desafios do aqui e agora, de tocar pessoas com graça e socorrê-las em amor; porque tudo o que importa é o “mundo espiritual”. De forma geral, essa denúncia contra a religião tem respaldo na vida prática, pois todos os dias o que se pode perceber é que quanto mais religiosa uma pessoa se torna, menos com um humano ela se parece, pois o seu olhar destina-se apenas a “deus” e em um movimento contrário, recusa-se a ver e perceber pessoas. Na história das religiões, pode-se notar que sempre existiu uma forte tendência à experimentação de uma espiritualidade de “alma”, que privilegia as coisas da “alma”, portanto, as coisas abstratas, transcendentes, subjetivas. Mas na mesma história das religiões, de forma geral, a “espiritualidade do corpo” foi negada. Mas o que diz Cristo? Que espiritualidade o Senhor dos senhores propõe? Para começar a responder, é bom que se afirme que Cristo nunca se propôs a fundar uma nova religião, ou um novo conjunto de dogmas e nunca defendeu uma fé alienante, que tornassem pessoas cegas quanto aos gritos de socorro da humanidade. Pelo contrário, Cristo nos propõe um estilo de vida, orientado por uma “espiritualidade de corpo e alma”, em que o transcendente e as coisas imanentes, visíveis, concretas encontrassem equilíbrio e harmonia. Por definição, Deus é Espírito (João 4.24), mas Ele se fez carne e habitou entre nós e vimos a sua glória (João 1.14). Foi com o corpo que Cristo revelou-se como “Emanuel” ou “Deus conosco”; foi com o corpo que Cristo foi ao encontro de pessoas enfermas, possessas, desesperançadas, enlutadas; foi com o corpo que Cristo revelou seu grande amor ao mundo, morrendo na cruz do calvário. Não obstante a essa realidade, Cristo também viveu, como homem, uma fé transcendente, sobrenatural. Fez isso quando deixava a multidão para buscar a face do Pai; quando deu ordens ao mar e ao vento, quando discernia o coração humano etc. A espiritualidade de Cristo é a conjugação perfeita entre corpo e alma. Negar o papel do corpo na fé cristã é abraçar a visão mais alienada do cristianismo, mas negar a alma é tornar a fé um elemento concreto e passivo de racionalização, e isto a fé não é. O que Cristo então nos propõe? Certamente uma fé de corpo e alma. A parábola do bom samaritano ilustra bem o que estou dizendo. A história conta que um homem foi atacado por assaltantes, e depois de ter todos os seus bens roubados, sofreu tamanha violência que caiu ao chão quase morto. No caminho passaram um sacerdote e um levita, os homens da fé, os religiosos que falavam em nome de “deus”, mas estavam comprometidos demais com seus afazeres no templo, no exercício de seus devidos ofícios “espirituais” ou “ofícios da alma” que foram incapazes de parar e socorrer o homem ao chão. Que fé é esta que me põe em contato com Deus, mas me distancia das pessoas e seus gritos de socorro? Que fé é esta que abre meus olhos para ver Deus e me torna cego para ver o meu próximo? Eu diria que esta fé fundamenta-se numa espiritualidade de “alma” em que apenas o transcendente me importa e que leva o corpo dos “homens de fé” para longe da prática do amor. A parábola conta que apenas um homem parou e socorreu e este era samaritano, uma “raça” tida como menos espiritual pelos judeus e não merecedoras das dádivas divinas. Curiosamente, foi exatamente este samaritano que soube harmoniosamente manifestar uma fé equilibrada, de “corpo e alma”. Não faz sentido um cristianismo que aliena as pessoas em templos, tornando-as enclausuradas e consequentemente improdutivas no Reino de Deus. A verdadeira espiritualidade cristã, nos leva ao nosso quarto, nos faz dobrar nossos joelhos em oração e buscar o Pai que vê em secreto; mas também nos faz levantar desse mesmo quarto e dizer para o Pai: “Eis-me aqui, pode me usar”, pois meu coração é teu, assim como meu corpo está para o teu serviço, pois sou templo do Teu Espírito. A verdadeira espiritualidade cristã, não aliena, mas nos põe em contato com o nosso próximo e nos permite revelar por meio de ações, graça e amor divinos. A verdadeira espiritualidade nos leva a fechar os olhos pra ver Deus, mas também me faz abrir os olhos pra ver o que Deus quer realizar nas vidas que me cercam, através de mim. Nossos olhos, mãos, pés, coração, enfim, nossos corpos são instrumentos de Deus na terra. É usando o nosso corpo, que o Senhor vai socorrer pessoas, abraçá-las, ampará-las, ensiná-las a verdade, consolá-las, corrigi-las etc. Qual é a sua espiritualidade? Se pudermos pensar em uma espiritualidade ideal, esta certamente será de “corpo e alma”. Como a Bíblia nos ensina em Tiago 1.27, a religião pura para com Deus envolve socorrer pessoas, sejam estas, viúvas, órfãos ou qualquer que necessite de socorro. Como templos do Espírito Santo, fazemos missões intercedendo, mas como crerão se não há quem pregue, é preciso também ir; precisamos interceder pelos famintos de pão, mas o pão precisa chegar a quem tem fome; precisamos interceder em oração por crianças que sofrem violência dentre de casa, mas é preciso abrir a boca e denunciar, é preciso prestar socorro, amparar. O Reino de Deus veio trazer mais que uma boa notícia, veio trazer vida na vida. “Porque a ardente expectação da criatura espera a manifestação dos filhos de Deus.” Romanos 8:19

Pr. Hilquias Fábio


sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Fé Integral


“Quero, pois, que os homens orem em todo o lugar, levantando mãos santas, sem ira nem contenda.” 1 Timóteo 2:8

O evangelho de Cristo sempre apontou para a integralidade da fé; até porque uma fé fragmentada, um coração dividido, um sujeito de muitas faces, uma vida de duplicidade nunca foi meta de Deus para nós. Mas numa sociedade de espetáculo, o que vale é a estética das coisas e não a essência das mesmas; o que conta são as representações no palco, a atuação ou o faz de conta, e não o caráter do sujeito que atua. Se a máxima é atuar, representar, fazer de conta, então, faz sentido a busca de uma identidade mais versátil, mais flexível, capaz de ser um pouco de tudo e atender, mesmo que esteticamente, as muitas demandas sociais; na família, no trabalho, na igreja, nos relacionamentos de amizade etc. Mas, a grande questão é que a lógica do Reino de Deus, quebra com esse modo de funcionamento “versátil” e nos propõe a entender, internalizar e sobretudo viver a verdade, a verdade de uma fé integral, que nos remete à vida de total transparência, diante de Deus e dos homens. Paulo, escrevendo ao jovem pastor Timóteo, expressa essa preocupação, propondo aos homens que orem em todo lugar, que levantem mãos santas, mas que isso reflita a verdade da fé cristã, que nos conduz ao caminho do acordo, da reconciliação, do perdão, da capacidade de amar acima de tudo; em outras palavras, Paulo afirma: orem, levantem mãos santas, mas que o coração esteja livre de ira ou contendas. Para Deus, o que conta não é o palco, em que representamos os papéis idealizados por nós ou pelos outros, mas quem somos com cara descoberta. Não adianta levantar mãos, como expressão de adoração ou “mãos santas” como afirma Paulo, se no campo dos relacionamentos somos incapazes de pôr à prova nossa fé e justificar pelas ações reconciliadoras nossa aliança com o Deus da reconciliação. Se não tomarmos cuidado, podemos ser tomados pelo sagaz engano, em acreditar que nossa fé só inclui Deus e nós. Na verdade, a verdadeira fé cristã, não celebra a individualidade, mas a coletividade, pois Deus quis pra si, uma família de muitos filhos. Alguém poderia perguntar: O que minha fé em Deus tem haver com as pessoas? Ou ainda: O que meus relacionamentos tem haver com o Reino de Deus? Eu afirmaria, a partir do pressuposto da fé integral, que tem tudo haver. Não tem Reino de Deus, se pretensiosamente levantamos “mãos santas” para Deus, se as mesmas mãos não abraçam, não acolhem, não afagam, não expressam perdão, não aproximam, não socorrem. O Reino de Deus extrapola e muito a minha relação exclusiva com o Eterno; inclui pessoas, e pessoas com as quais preciso expressar amor e viver bem. Somente pessoas bem resolvidas em seus relacionamentos, livres de mágoas, iras, ressentimentos ou contentas podem levantar “mãos santas” em adoração a Deus. Como afirmam as Escrituras: Se alguém diz: “Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu?” 1 Joao 4:20. Não adianta representar uma fé que impressiona no templo, no levantar das mãos à Deus, se minhas mãos não tocam com graça e misericórdia àqueles que me cercam; se sou incapaz de tolerar, em amor, as diferenças dentro da  família, do ambiente de trabalho ou mesmo na igreja. Para muitos, é tempo de sair do palco, parar de representar e amar de verdade, a Deus e ao próximo, pois “aquele que não ama não conhece a Deus; porque Deus é amor.” 1 João 4:8. Oremos em todo lugar, levantemos mãos santas, sem ira, nem contenda.

Pr. Hilquias