sábado, 31 de dezembro de 2011

Põe em ordem suas finanças

E disse ao povo: Acautelai-vos e guardai-vos de toda espécie de cobiça; porque a vida do homem não consiste na abundância das coisas que possui.” Lucas 12:15

     É assombroso como nossa geração se afirma a partir das coisas. Houve um tempo que as coisas só nos fascinavam, mas este é um tempo que as coisas nos definem e até mesmo nos dominam. Somos marcados por um materialismo exacerbado e imperialista, que arrebata o nosso olhar e nosso coração. A palavra de ordem é ter e ter e ter e sempre ter mais, pois o que temos nos define. Onde moramos, que tipo de casa habitamos, que marca de roupa vestimos, que tipo de restaurantes frequentamos, que modelo e ano de carro possuímos, que cidades e países conhecemos, que títulos acadêmicos acumulamos etc, dizem muito sobre nós, nessa cultura coisificada, nessa cultura de supervalorização das coisas. Mas quanto custa ter e manter esse status quo, ou este estado atual das coisas? Certamente não custa pouco. Custa mais que tempo, mais que esforço, mais que trabalho; custa dinheiro. A manutenção de nossas cobiças, do desejo de nossos olhos não é barato e é por isso que a Palavra de Deus nos chama a atenção para a cautela diante da cobiça. A cobiça é um bicho “come, come” insaciável, que jamais se dará por satisfeito, que sempre quer mais um pouco. Quem se sujeita aos caprichos da cobiça morre enforcado em dívidas e vergonha. “Acautelai-vos e guardai-vos de toda espécie de cobiça...” Lucas 12.15a. Mas, ao que parece, é um contrassenso cultural frear os desejos de nossos olhos, que buscam ter mais um vestido, mais um carro, mais um notebook, mais um celular, mais um par de sapatos, a câmera de última geração, a viagem dos sonhos, a camisa da moda, as pílulas que prometem milagres na balança etc. Mas volto a afirmar que o preço é alto para quem se sujeita aos caprichos da cobiça. A globo.com divulgou em 18/08/2011 que no Brasil, 64% estão endividados e 32% assumem que não tem como pagar a dívida. Temos dicas de sobra para uma boa economia doméstica, disponíveis em sites, livros, jornais; mas, sinceramente nenhuma dica vai conter a cobiça, pois trata-se de uma mazela que nos habita, um pecado resultante da queda do homem, uma herança adâmica. Não se contem pecado com dicas de economia, mas, sobretudo com poder e graça de Deus. O romancista russo Fiodor Dostoievski disse: “Há um vazio no coração do homem do tamanho de Deus”. O homem só se realiza completamente em Deus e qualquer outra tentativa tende ao fracasso. Nossos descontentamentos, nossas insatisfações nos levam à uma vida cativa da cobiça. Se somos uma geração que precisa de coisas para alcançar uma tal felicidade, somos, por consequência uma geração vazia de Deus.
     Por traz do grande endividamento financeiro reside uma divida espiritual, devemos a Deus nosso amor, nossa devoção, nossa fé, nossa obediência; pois como diz a Palavra “...a vida do homem não consiste na abundância das coisas que possui.” Lucas 12.15b. Eu acrescento, que a vida do homem consiste na comunhão com o céu e na sujeição ao governo de Cristo, em que tomamos Deus como o bem maior; como afirmava Davi: "Tu és o meu Senhor; não tenho bem nenhum além de ti" Salmos 16:2
     As dívidas, os apertos financeiros, dizem dos nossos reais valores, dizem de nossa necessidade de nos afirmamos a partir das coisas, quando deveríamos nos afirmar a partir da fé em Cristo. Paulo declara: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim.” Galátas 2.20. A partir desta declaração fica fácil entender como Paulo se relacionava com as coisas, com a matéria, ao declarar: “E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como escória, para que possa ganhar a Cristo” Filipenses 3.8. O maior problema não é o quanto de coisas possuímos, mas o quanto somos possuídos por elas.
     Quer colocar em ordem suas finanças? Comece pela base, comece colocando em ordem suas prioridades, seus valores. Se não tratarmos da cobiça, não será mais uma dica orçamentária que nos salvará. “Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” Mateus 6.33
      O dinheiro é uma benção, ter coisas, um privilégio, mas, nada substitui um coração cheio da presença de Deus. Redefina suas prioridades, restabeleça os reais valores da vida, busque a Deus, liberte-se da cobiça e não será difícil colocar suas finanças em ordem.

"A cobiça é insaciável; para o cobiçoso, tudo é pouco."
"Não é pobre o que tem pouco, mas o que muito cobiça"


Pr. Hilquias



 

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Põe em ordem os seus afetos


Sobretudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida.” Provérbios 4.23
 
     Vivemos numa sociedade subjugada pela tirania da vigilância, em que cada passo dado é observado pelas muitas câmeras espalhadas pelos bancos, comércios, escolas, hotéis, elevadores, ruas etc; uma sociedade nomeada por Gilles Deleuze, como sociedade de controle. Controlar foi incorporado ao modo contemporâneo de frequentar o mundo, e vivemos num verdadeiro confinamento social, em que nossos passos privados tornaram-se públicos. Mas, concomitantemente, existe um terreno pouco vigiado, pouco controlado; um terreno que corriqueiramente vive à merce do acaso, do destino, da sorte. Me refiro ao terreno das emoções, dos afetos. Nunca tivemos, na história da humanidade, um número tão grande de pessoas adoecidas afetivamente. Consequentemente, o que temos, é uma avalanche de crises conjugais, crises entre pais e filhos, desacordos entre patrões e empregados; contradições e contrariedades entre amigos de longas datas; enfim, uma tremenda dificuldade no campo dos relacionamentos. Os afetos nos afetam! De forma descuidada, passamos a cultivar sentimentos letais: ódio, ressentimento, amargura, inveja, vingança, mágoa, indiferença, frieza, desconfiança, insegurança etc. E o pior, convivemos com essa realidade como cegos, sem perceber a dimensão dos danos provocados em nossa existência, até que, num dado momento, adoecemos. Se fôssemos tão vigilantes quanto aos afetos, como nossa sociedade é em relação aos cidadãos, certamente seríamos muito mais felizes. Mas, ao contrário, o descuido quase generalizado é o que marca o universo afetivo.
      Salomão, em sua sabedoria, afirma que acima de qualquer coisa, precisamos aprender a guardar o nosso coração, que simbolicamente pode ser entendido como centro das emoções; pois do coração procedem as saídas da vida, ou as decisões da vida. E é incrível como os afetos são determinantes das escolhas que fazemos ao longo da vida. Por traz do carro que andamos, da roupa que vestimos, das pessoas com quem convivemos, dos livros que gostamos de ler, dos lugares que frequentamos, dos estilos musicais que preferimos, das cores e sabores que apreciamos, tem afetos, tem sentimentos. E até mesmo o mais racional dos mortais, mesmo negando esse realidade, também decide a vida a partir dos afetos, mesmo que, nesses casos extremos, o afeto seja indiferença ou ceticismo. Os afetos nos afetam! Daí o desafio de colocar nossos afetos em ordem. Feliz é o ser humano que no campo das emoções consegue, mesmo que minimamente, se compreender e sabiamente administrar seus sentimentos.
     Existem pessoas que no campo profissional são meticulosas, detalhistas, organizadas, controladas; mas no campo das emoções vive um verdadeiro tsuname e o resultado não poderia ser outro, senão um caos existencial. Tudo do lado de fora está aparentemente em ordem, mas no recôndito do coração impera a desordem.
     Se alguém te perguntasse: como está o seu coração? Que resposta você daria? Gostamos de afirmar quando indagados, que está tudo bem, pois soa melhor dizer assim. Mas, se mergulharmos na alma de muita gente, vamos encontrar uma verdadeira bagunça, no que tange aos afetos.
     Podemos e devemos esperar que 2012 seja um ano próspero, um ano de muitas realizações e conquistas, mas, o que será 2012, está diretamente ligado à maneira que vamos administrar nosso coração, nossos afetos. Põe em ordem o seu coração, põe em ordem seus afetos! Faça uma faxina bem feita, limpe, organize, selecione, escolha, descarte, mas não entre mais um ano com seu coração em desordem. Peça ajuda ao Senhor, se dobre diante dEle, grite por socorro, clame e ponha como valor norteador da vida, um coração leve e cheio de saúde afetiva.

"O coração tem razões que a razão desconhece." Blaise Pascal
"No coração do homem é que reside o princípio e o fim de tudo." Leon Tolstoi
 
Pr. Hilquias 

 

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Põe tua casa em ordem

Naqueles dias Ezequias adoeceu de uma enfermidade mortal; e veio a ele o profeta Isaías, filho de Amós, e lhe disse: Assim diz o SENHOR: Põe em ordem a tua casa, porque morrerás, e não viverás.” Isaías 38.1

      Somos tendenciosos à desordem, como resultado do pecado original. Por mais que lutemos para manter as coisas nos seus devidos lugares, o pecado que nos habita desorganiza nossa existência. Quando olhamos para o princípio de tudo, encontramos Deus dando ordens ao mundo caótico, sem forma e vazio e tornando-o num complexo e fantástico mundo organizado, em que tudo funciona em perfeita sincronia e equilíbrio. Mas também quando olhamos para o princípio, encontramos Eva e Adão sedendo aos apelos da serpente e mergulhando no mundo da desobediência. Que insanidade! O jardim que era sinônimo de intimidade com Deus, transforma-se em um lugar de fuga e vergonha. O que temos com isso? Temos novamente o império da desordem como valor presente na existência humana e não é preciso ir muito longe pra afirmar que o caos estava posto à mesa e era só se servir: Caim mata Abel, temos portanto, o primeiro crime na família. Enfim, a ordem é resultado do governo de Deus; a desordem, consequência do pecado. Em torno da presença de Deus tudo se organiza: nosso tempo, nossos afetos, nossos relacionamentos, nosso dinheiro, nossa fé. Mas se a vida é marcada pela fuga de Deus, não se pode esperar outra coisa, senão uma existência caótica.
      Ezequias recebe um decreto de morte e uma direção para colocar a casa em ordem, antes de sua partida. Se observamos os versículos seguintes, vamos perceber que Ezequias argumenta com Deus sobre esse decreto e se utiliza de seus “créditos espirituais” para suplicar a Deus mais um tempo de vida - “lembra-te agora, de que andei diante de ti em verdade, e com coração perfeito, e fiz o que era reto aos teus olhos.” (Isaías 38.3). A visão que Ezequias tinha de si mesmo apontava para uma vida em ordem; no entanto, o olhar de Deus, percebia desordem; daí a orientação: “põe em ordem a tua casa”. Ezequias era fiel, mas haviam áreas e aspectos da sua vida que precisavam ser colocadas em ordem. Isso significa que mesmo buscando a Deus e tendo com ele intimidade, é possível que existam aspectos da nossa vida que precisam ser consideradas e colocadas em ordem.
      Uma outra curiosidade no que toca ao assunto, é que, muito comumente refletimos sobre a vida quando, por alguma razão, tivemos nossa vida ameaçada; seja por conta de um acidente sofrido, a descoberta de uma doença grave, um assalto à mão armada etc. Sob essas circunstâncias pausamos, desaceleramos tudo e refletimos sobre o privilégio que é viver e sobre a necessidade de viver melhor; o que inevitavelmente nos levará a organizar a vida. Só temos uma chance para viver, portanto, é importante que se viva bem, que se viva direito. Põe tua casa em ordem!
     Estamos recebendo de Deus a dádiva de mais um ano. 2012 pode ser uma bênção, mas pode ser um caos e muito depende de nossa postura diante da vida. Põe a tua casa em ordem!
É importante destacar, que quando se fala de “casa”, não trata-se apenas do espaço que vivemos, mas toda a nossa existência, com suas complexidades. Trata-se da casa, mas também das finanças, do tempo, dos afetos, dos relacionamentos, da carreira profissional, da vida com Deus e muito mais.
     Pare um pouco, ore, busque a Deus, reflita e considere os aspectos de sua vida que precisam de ordem. Lembre-se que somente em torno de Deus a vida pode ser organizada. Então, convide o Senhor para te ajudar nesse tarefa tão desafiadora e transforme 2012 em um ano de grandes realizações. Põe a tua vida em ordem!

"Não faças da tua vida um rascunho, pois pode não haver tempo de passar a limpo." André Rossato


Pr. Hilquias
 



OBS: Ao longo dos próximos artigos, vou abordar os aspectos mais importantes e mais comuns da vida, que costumeiramente negligenciamos e consequentemente se transformam numa bagunça.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Um amor que nos constrange


“Porque o amor de Cristo nos constrange...” 2 Coríntios 5:14.

     Curiosamente a palavra constranger significa impedir os movimentos, tolher o meio de ação, embaraçar. Fico pensando na dimensão do amor de Deus por nós e tento imaginar se existiria alguma coisa que pudéssemos fazer, que servisse de pagamento por tamanho amor. Mas, o que ofertar a um Deus que tudo possui, que é Senhor de tudo? Nada, absolutamente nada do que ofertarmos lhe acrescentará alguma coisa, “porque a terra é do Senhor e toda a sua plenitude.” (1 Coríntios 10.26). O amor de Deus nos constrange, nos deixa embaraçados, nos impede de agir. Nenhuma ação humana pode ser compensatória em relação ao amor de Deus. O que nos resta? Resta-nos a gratidão, resta-nos a adoração. “Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” 1 Coríntios 6.20. Não podemos acrescentar nada ao Senhor, mas, podemos glorificá-lo com nosso corpo e espírito, como forma de gratidão, o que é, na verdade, a perfeita adoração que o Pai procura.
     André Comte-Sponville em sua obra “pequeno tratado das grandes virtudes”, apresenta a gratidão como um eco. À medida que nos tornarmos gratos, perpetuamos a dádiva, pois esta passará a ecoar por toda a existência e jamais se perderá. Ao contrário, a ingratidão produz o sepultamento de grandes memórias e nos impossibilita de expressarmos adoração marcada pela verdade e pela sensibilidade. Tudo o que precisamos é de gratidão! Somos parte de uma cultura que aprendeu a pagar por tudo e que se surpreende com a dádiva. Não é incomum desconfiarmos de preços baixos, de liquidações e de brindes. E e se alguém com quem não temos vínculo de afeto nos presenteia, logo indagamos: “o que fulano está querendo?”. É nessa perspectiva que erramos, pois tudo que vem de Deus é dádiva não merecida, é presente, é graça e não se paga por presentes. Presentes recebemos e agradecemos. Me agride estar diante de um Cristianismo orientado pelo capitalismo que decididamente se relaciona com o sagrado e mais especificamente com Cristo pela via do pagamento. Devemos e precisamos ofertar, dizimar, frequentar cultos, servir ao próximo, mas, jamais, como forma de pagamento, apenas como forma de gratidão. O amor de Cristo nos constrange, nos impede de agir - “Que darei eu ao SENHOR, por todos os benefícios que me tem feito?” (Salmos 116:12) Só se paga amor com amor, e uma forma tremenda de expressão do amor é a adoração em tom de gratidão. “Amarás, pois, o SENHOR teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças.” (Deuteronômio 6.5) Não tente pagar pela graça, seja grato, ame, adore!

     “A gratidão é o único tesouro dos humildes.” William Shakespeare

     Pr. Hilquias

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

O Perigo de Uma Única História

João 8. 3-11

    A vida em toda sua complexidade não pode ser contada de uma única forma. O que somos requer mais do que uma ótica para dar conta de explicar.  E como afirma a jornalista da Época, Eliane Brum:  “Contar uma única versão sobre nós mesmos pode significar abrir mão de viver.” Somos uma sobreposição de muitas histórias, e uma cena da vida, num dado momento, é mais que uma cena recortada, é a representação de uma bagagem ampla e diversa de toda uma existência.  A romancista nigeriana Chimamanda Adichie, uma contadora de histórias, adverte que se ouvirmos apenas uma história sobre outra pessoa, arriscamos um desentendimento crítico. Ou seja, qualquer opinião pode ser incompleta, incoerente ou até mesmo vazia, se tudo o que temos é uma ótica, uma única ótica.
    A história única empobrece e até aniquila a vida e impossibilita uma melhor compreensão do outro que está diante de nós. Lembro-me da história de uma mulher, sem nome, mas, marcada pelo estereótipo de “mulher adúltera”, registrada em João 8. 3-11. Que o adultério é um pecado, uma transgressão, todos sabemos, assim como os fariseus também sabiam. Mas,  a história narrada por eles, por mais que verídica, uma vez que a mesma foi pega em flagrante adultério (João 8.4), não dizia tudo sobre aquela mulher.  Ela era mais que uma mulher adúltera, e ninguém investigou isso. Que outras histórias essa mulher contaria sobre si, se tivesse a liberdade de fazê-lo? O interessante é que Jesus tinha outro olhar, e foge dessa única história contada pelos acusadores, e carregado de compaixão enxerga uma mulher, com seus medos, fracassos, angústias, sonhos frustrados, culpa e muito mais. O olhar de Jesus se recusava a capturar apenas a cena da transgressão, e indo mais além, enxerga o particular, o secreto do coração. Em momento algum o Senhor foi conivente com o seu pecado, mas perdoando-a, a fez entender que ela poderia ser mais que uma mulher adúltera, poderia ser uma mulher livre, abençoada, transformada pelo amor. Talvez, se muitos de nós estivéssemos no lugar de Jesus, continuaríamos contando a mesma história sobre esta mulher, pois é mais cômodo emitir um julgamento sem reflexão e rotular as pessoas, contando sobre elas alguma história fixa, do que mergulhar em suas vidas e tentar entendê-las a fundo e dizer sobre elas algo além do obvio, algo além da mesmice dos discursos já anunciados.
    Ser cauteloso antes de contar uma única história sobre alguém é evitar um julgamento precoce e superficial, e dar àqueles de quem falamos, o privilégio de contar outras histórias sobre si.

"Não julgueis segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça" 
 João 7.24

“Julgamento é sempre defeituoso, porque o que a gente julga é o passado.” Guimarães Rosa

Pr. Hilquias


segunda-feira, 28 de março de 2011

Solidão e Liberdade

“Cada um só pode ser ele mesmo, inteiramente, apenas pelo tempo em que estiver sozinho. Quem, portanto, não ama a solidão, também não ama a liberdade: apenas quando se está só é que se está livre.” Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'
Somos convidados o tempo todo a fugir da solidão, pois a mesma é interpretada como ameaçadora; e conceitualmente de fato é. Mas a solidão pode ser compreendida de várias maneiras. A solidão pode ser vista como violência contra nossa condição humana, que grita por encontros, por comunhão; pode ser sinônimo de morte, de vazio, de ausência, de desprezo, de rejeição etc. No entanto, a solidão pode ter outra conotação, pode ser entendida como um espaço singular para expressão da verdade e manifesto da liberdade. Todos que desejamos crescer precisamos de certa dose de “solidão”. Em outras palavras, precisamos nos encontrar com nós mesmos, e a partir desse espaço de genuína liberdade, expressar diante de Deus nossas verdades. Nesse sentido, a solidão pode produzir alterações fantásticas em nosso caráter, visão de mundo, postura diante de vida.
Moisés, Abraão, Davi, Daniel, João Batista, Paulo e até o próprio Jesus Cristo precisou de “solidão”. Estar só, faz parte dos planos de Deus para a vida cristã.
Uma das passagens bíblicas que mais que chama a atenção a respeito desse valor é Mateus 6.6 “Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.”
Jesus sabia o valor da “solidão” quando se está em questão buscar a Deus. É quando estou sozinho num quarto, que encontro plena liberdade, diante do Pai, para repartir com Ele verdades profundas sobre mim. É obvio que esta não é a única maneira de orar, mas é certo que é a mais profunda e  geradora da mais extraordinária intimidade espiritual.
Cristo sempre esteve cercado de multidões, mas nunca abriu mão da maravilhosa experiência de estar sozinho com o Pai. “E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a tarde, lá estava ele, só.” Mateus 14.23
A comunhão e solidão não são antagônicas, não se contrapõem; ao contrário, são dois lados de uma mesma moeda, pois a "solidão" nos prepara para vida em sociedade. Cristo como ninguém conjugou esses dois pólos de espaços vitais. Ele (Cristo) soube como ninguém valorizar os contatos, os encontros, as oportunidades de estar com gente, muita gente e com elas dividir os valores e milagres do Reino do Pai; mas nunca desprezou os preciosos momentos de "solidão"; momentos esses que lhe restauravam as forças e o potencializava a retornar às multidões com muitos sinais e maravilhas.
No meu entendimento, quem não está preparado para valorizar os momentos de “solidão”, jamais estará preparado para viver plenamente a comunhão. Pois, é à medida que exploro a solidão, como espaço de plena liberdade, é que posso tratar diante de Deus as verdades sobre mim.
Quer um conselho? Não despreze a “solidão”,  mas use-a para encontrar caminhos nobres, para andar diante de Deus e diante dos homens com honra e dignidade.

Pr. Hilquias





segunda-feira, 14 de março de 2011

As Armadilhas da "Esperança"

“Os mortos não louvam ao SENHOR, nem os que descem ao silêncio.” Salmos 115:17

“A esperança é a última que morre”, declara o dito popular. Estamos impregnados pela esperança e de certa forma não vivemos sem ela. Mas existem esperanças e esperanças. A esperança pode ser entendida como paciência, como o exercício de esperar, até que um sonho se realize, até que o casamento saia, até que o emprego venha, até que o filho nasça, até que, até que... Nessa perspectiva tal esperança pode estar alinhada à fé e sem sombra de dúvida, este tipo de esperança torna a vida menos pesada e conseguimos lidar mais facilmente com nossos desejos frustrados temporariamente; porque sabemos que será uma questão de tempo e o que esperamos, pela fé, tornar-se-á realidade, no que tocar à vontade de Deus. Já dizia Davi: “Deleita-te também no SENHOR, e te concederá os desejos do teu coração.” Salmo 37.4
No entanto, existe uma esperança perigosa, que sem percebermos nos faz assinar antecipadamente nosso próprio atestado de óbito. É a esperança que nos faz adiar a vida, que nos leva a projetar para o futuro e sempre para o futuro, sonhos que poderiam ser realizados no presente. De um jeito discreto e ardilosamente mortal, esta esperança travestida de paciência e até de piedade, nada mais é que falta de fé e de ousadia. Uma esperança que se sustenta na nossa incapacidade de dar o passo seguinte, desconfiando se o Senhor nos sustentará enquanto andarmos por sobre as águas.
Não podemos contar com o passado, pois este já não é; nem tão pouco com o futuro, pois ainda não é. Se temos um tempo, é o presente. Se você passar o resto da vida esperando, no sentido de assumir covardemente a postura de alguém que nunca arrisca viver; o máximo que poderá ser alcançado é uma experiência de quase realização, portanto, uma “realização” fragmentada, fantasiosa e sem raízes na realidade.
A vida passa e mais rápido que podemos imaginar; e uma forma divina de afirmar a vida, enquanto dádiva de Deus é valorizando o tempo chamado agora, pois é o único com o qual realmente podemos contar. Quanto ao futuro, este diz respeito a Deus, o Senhor que está acima do tempo.
Não espere a vida passar para amar, para perdoar, para edificar um lar, para compartilhar a fé, para servir ao faminto, para usufruir da companhia dos amigos, para começar um projeto de vida; não espere a vida passar para gastar tempo com seus filhos, para fazer um investimento, para se arriscar na música ou na poesia; não espere a vida passar para abrir os olhos e perceber fora de tempo que já é tarde demais e me resta lamentar e somente lamentar. “Lembra-te também do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais venhas a dizer: Não tenho neles contentamento” Eclesiastes 12:1

“A esperança que se retarda deixa o coração doente, mas o anseio satisfeito é árvore de vida.” Provérbios 13:12

Pr. Hilquias 

domingo, 13 de março de 2011

Diga a Verdade Sobre Você

 “Jacó, porém, ficou só...” “E disse-lhe: Qual é o teu nome? E ele disse: Jacó”  Gn 32.24,27


Um dos caminhos mais difíceis de ser percorrido é o da auto-análise ou auto-avaliação. É relativamente fácil emitirmos nossa opinião sobre o outro, mas dizer a verdade sobre nós mesmos é simplesmente desconfortável e desafiador.  Como diz Paul Stevens: “Dizer a Deus toda a verdade sobre nós mesmos é um milagre”.
Quando o nosso olhar é direcionado para fora, as palavras ganham um tom de facilidade; mas se nosso olhar faz o caminho inverso e começamos a olhar para dentro de nós; as palavras pesam, se desorganizam, fogem. Então sobra fugirmos; e não se trata de uma fuga qualquer, mas de uma tríplice fuga: fugimos de Deus, dos outros e nós mesmos.
Fugimos de Deus, porque é difícil encarar alguém que sabe tudo sobre nós; que conhece nosso íntimo; que vê o coração - “...O homem vê o exterior, porém o Senhor, o coração.”  1 Samuel 16.7. É difícil ter que olhar para alguém que antes da palavra chegar à língua, já as conhece; que esquadrinha nosso andar e deitar. Diante dEle todas as coisas estão descobertas e patentes; então, se não queremos saber sobre nós, resta-nos a tarefa de fugirmos, mesmo que a posteriore tal fuga não nos conduza a lugar algum.
Fugimos do outro, porque se firmamos alianças, estreitamos amizades, estabelecemos vínculos de afeto, logo comprometemos nossa privacidade. Quanto mais perto alguém estiver, quanto mais íntimo for, maior chance ele terá de acessar a verdade sobre nós.  Mais uma vez resta-nos fugir, assim “garantimos” a segurança de nossos segredos.
Fugimos de nós mesmos, tememos estar sozinhos, porque se pausamos para refletir, para fazer uma auto-análise; se decidimos não mais nos enganar, e nos propomos a rasgar o coração e não negociar a verdade; se assumimos a postura de enfrentamento sobre quem somos; corremos o risco de descobrirmos e enxergarmos o que não gostaríamos de atestar: nossos fracassos, nossos pecados, nossas mazelas. Então, se não somos capazes de lidar com a verdade sobre nós; resta-nos outra vez fugir.
Mas até quando seremos capazes de sustentar uma vida em fuga? Jacó decidiu parar de fugir e encarar uma realidade dura, uma realidade que revelava um homem usurpador, com defeitos de caráter que se arrastava por anos. Era tempo de concertar as coisas e mudar de vida. Então Deus o levou ao Vau de Jaboque e lá esteve só. Sem ninguém por perto, Jacó rasgou o seu coração e disse, respondendo a pergunta do anjo: “me chamo Jacó”, em outras palavras, ele estava confessando: “sou trapaceiro”.  O milagre na vida de Jacó começou quando ele resolveu dizer toda a verdade sobre si mesmo a Deus.  Ele decidiu para de fugir, decidiu direcionar seu olhar para dentro de si, reconhecer seus limites e pecados e esperar por um milagre da parte de Deus - Não te deixarei ir se me não abençoares” Gênesis 32.26. De Jacó (trapaceiro), passou a se chamar Israel (príncipe de Deus). Ninguém muda de vida fugindo, mas no enfrentamento, por mais duro que pareça.

Quer um milagre? Quer mudar de vida? Para de fugir e confesse toda a verdade sobre si mesmo a Deus.

 “Porque nada podemos contra a verdade, senão em favor da própria verdade.” 2 Coríntios 13.8

“O que encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia.” Provérbios 28.13

Pr. Hilquias

sábado, 12 de março de 2011

Vida Para Além do Comum

“Não ameis o mundo, nem o que no mundo há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele.” 1 João 2:15

Bem vindo ao mundo globalizado! Isso pode soar como comemoração, uma vez que a globalização é entendida como um dos processos de aprofundamento da integração econômica, social, cultural e política em níveis nunca vistos ou experimentados. Não existe mais distância, pois estas foram quebradas pelos avanços tecnológicos no campo dos transportes, das operações financeiras, das telecomunicações etc. Então, viva a globalização!
Mas nem tudo é alegria nesse esquema social que se põe a integrar os povos. Junto com seus benefícios surgem formas perigosas de vida; dentre elas destaco a homogeneização dos comportamentos (homogêneo = da mesma natureza que outro; análogo). Essa condição mostra sua cara na moda, nos relacionamentos, na forma de se gastar o tempo e o dinheiro; na culinária e até na maneira de definir a fé. O processo é simples, criam-se padrões e estes são adotados como “normas sociais” e quem não as segue automaticamente se exclui. O comum é tentar ser igual ou aproximar-se minimamente dos padrões. Então não se tem um jeito exclusivo de ser japonês, americano ou brasileiro. É tudo junto e misturado. Não é difícil ver um americano comendo sushi e nem um japonês degustando um sanduíche do Mcdonald.
Aparentemente podemos interpretar como possibilidades, o que de fato é, mas ao mesmo tempo há uma espécie de imposição à imitação sem reflexão. Temos que comer o que todo mundo come, vestir o que todo mundo veste, falar a língua que todo mundo fala, lidar com nossos relacionamentos de afeto como todo mundo, ver a fé como todo mundo vê, enfim, tornarmo-nos análogos, da mesma natureza ou homogêneos. Vale ressaltar que enquanto falo da homogeneização, também penso na multiplicidade, no entanto, emerge da multiplicidade estilos “certos” de se viver.
Mas será que como cristãos podemos fazer, pensar, vestir, comer, falar como todo mundo. Certamente que não precisamos romper com este mundo, enquanto mundo cultural, ou seja, podemos comer sanduíches do Mcdonald e tomar Coca-Cola; mas precisamos nos diferenciar dos padrões apontados como normais, à medida que põem os nossos valores morais e espirituais em check . Não fomos chamados para ocupar o lugar COMUM, mas sim o DIFERENTE. Viver a fé integralmente, pressupõe andar em muitos momentos na contra-cultura, no desacordo, no dissenso.
O mundo, enquanto sistema que se apõe à Palavra de Deus, não é pra ser experimentado e amado, até porque “se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele.” 1 João 2:15. Deus nos chama para vivermos uma vida para além do comum, nos chama para sermos diferentes, fazermos a diferença. O mundo corrompido pelo pecado e consequentemente em colapso moral, não precisa de respostas que venham dos padrões homogêneos, até porque foram muitos desses padrões que o conduziu a este estado; mas o requerimento é por um padrão que se mostra forte pela diferença.
Se todo mundo terceiriza a educação dos filhos; negocia uma boa amizade; trai o cônjuge; cresce pela via da corrupção; ignora a Deus; age com violência psicológica ou física; faz da mentira uma forma de vida; não significa que temos que repetir tais comportamentos. Podemos pela fé recusá-los e encontrar na Palavra de Deus o jeito certo de se viver, o jeito que produz afetos saudáveis, respeito, honra, honestidade, amizade, amor, perdão, bondade, vínculos fortes de amizade, casamentos abençoados,  famílias estruturadas, temor a Deus, fé inabalável, saberia e muito mais.
Se tivermos que ser parecidos com alguém, se tivermos que seguir algum padrão, que este seja Cristo, autor e consumador de nossa fé. Já afirma o apóstolo Paulo: “Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados” Efésios 5:1
Você não foi perdoado, salvo, amado para ocupar o lugar comum e fazer o que todo mundo faz, mas a ocupar o lugar incomum, diferente, o lugar da sujeição a Deus, da obediência a qualquer custo, o lugar do discipulado.

“Fostes comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens.” 1 Coríntios 7:23

Pr. Hilquias

quinta-feira, 10 de março de 2011

Autonomia e Fé

Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim. Gálatas 2:20


A abertura cultural no campo da ética, da moral, do mundo estético; a queda das censuras públicas, dos governos ditadores; as possibilidades de expressão por meio da arte, da música, da dança, da poesia; proporcionaram nas últimas décadas avanços consideráveis. Mas, juntamente com tais avanços, instalou-se a busca desenfreada por autonomia e liberdade. Ninguém mais aceita passivamente uma coação, um mando. Toda e qualquer ordem passa pelo crivo da liberdade pessoal, podendo ser respondida positiva ou negativamente. Tudo se tornou extremamente relativo.
Enquanto o assunto toca apenas a cultura, é possível, de fato, apontar muitas vantagens nesse tempo de autonomia humana. No entanto, por trás dessa cultura libertária, reina sutilmente uma filosofia humanista execrante dos valores espirituais, expondo cada cristão à uma avalanche de possibilidades de pecar; tudo em nome da liberdade.
O discurso é simples: “somos autônomos ”. Mas até que ponto autonomia é a plena vontade de Deus? Antes de qualquer coisa, é preciso entender o que está por trás desta palavra.  Autonomia do grego, autos = por si só +  nomós =  lei, ao pé da letra esta palavra significa “lei por si só”, ou “lei própria”. Autônomo é aquele que si manda, si governa, que tem a lei internalizada e, portanto, não precisa em tese, de uma lei externa.  Ele pensa e age na liberdade plena, pois se autogoverna.
A questão é que, o Evangelho nos propõe outro caminho, outro padrão de entendimento. Aquele que está em Cristo, crucificou seu “Eu”, sua vontade, suas leis, seus valores idiossincráticos, privados e estabeleceu como lei absoluta, a lei de Cristo ou a vontade de Cristo. Como o apóstolo Paulo afirma: “...vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim”.
Homens de fé, de certa forma são autônomos, se entendermos autonomia como maturidade para decidir sobre a vida; mas à luz da etimologia da palavra autonomia, é impossível um homem viver plenamente o cristianismo, o discipulado, sem que antes crucifique suas próprias leis e acolha a soberana vontade de Deus. Já dizia Jesus: “Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me” ( Mateus 16:24).
Alguns poderiam argumentar que o Evangelho produz liberdade; eu diria: é verdade. No entanto, a maior liberdade é aquela que nos permite romper com as cadeias do inferno e do pecado. Ao contrário disso, a liberdade e a autonomia têm sido usadas para justificar o pecado, o erro, as mazelas humanas. Se temos liberdade em Cristo,  então que usemos esse poder para amar a Deus e obedecê-lo.
O filósofo Greg Bahnsen, afirma em seu livro Teonomia na Ética Cristã que na autonomia o indivíduo é a fonte de sua ética, de sua lei, de sua moralidade. No entanto, na teonomia a fonte da Lei é Deus (Téo = Deus + nomia = lei). Se precisamos de alguma lei que conduza nossa história de vida, certamente, esta é a teonomia, a lei do Senhor. “A lei do SENHOR é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho do SENHOR é fiel, e dá sabedoria aos simples. Os preceitos do SENHOR são retos e alegram o coração; o mandamento do SENHOR é puro, e ilumina os olhos.”  Salmos 19-7,8
É tempo de destronar nosso ego e devolver a Cristo sua centralidade em nossa vida. Se erramos nesse tempo, erramos por buscar uma lei própria, marcada por relativismos absurdos; erramos por ignorar a voz de Deus que se revela por sua Lei.

Precisamos de cruz, de sacrifício – “Já estou crucificado com Cristo”. Gl 2.20

“Porque qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas, qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará.” Marcos 8:35

Pr. Hilquias

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O Perdão Produz Encontros

“E tudo isto provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação” 2 Coríntios 5:18

    Gosto de pensar sobre o perdão como uma das armas mais poderosas no campo dos relacionamentos. Na ausência do perdão não há qualquer possibilidade de convivência. Somos gente, e como tal, errar faz parte de nosso registro. É possível esforço, boa vontade, sabedoria e outras virtudes como valores que nos permitam evitar (pelo menos boa parte das vezes), sobre a vida daqueles com os quais convivemos e amamos, o erro. Mas, cedo ou tarde o erro emerge como marca indelével de nossa humanidade e nessa hora vamos precisar aprender o caminho do perdão. Ou abraçamos o perdão como estilo de vida, ou nos enclausuramos nos guetos da solidão. Quem não perdoa termina sozinho!
    Mas se o perdão é tão necessário ou mesmo indispensável, qual o seu alvo? Imagino que a palavra mais perfeita para substanciar o objetivo do perdão é RECONCILIAÇÃO. É o que afirma o apóstolo Paulo, que Deus nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo. O perdão de Cristo produz reconciliação entre nós, pecadores e Deus. A marca da reconciliação é ENCONTRO. Toda manifestação de perdão precisa produzir encontros e mais que isso, bons encontros. Gosto da palavra de Martin Luther King a respeito desse valor: “O perdão é um catalisador que cria a ambiência necessária para uma nova partida, para um reinício.” Precisamos sempre de novas partidas, novos inícios, de encontros, de reconciliação. Há aqueles que afirmam: “eu perdôo, mas não quero convivência” ou ainda “eu perdôo, mas o quero bem distante”. Acredito que não foi esse o ideal de Deus quando nos enviou Jesus. Imagine Deus dizendo: “eu perdôo, mas não quero contato”. Quando Deus nos perdoou na eternidade, nos enviou Jesus, seu único Filho e sua marca foi ENCONTRO. Em Cristo, Deus estava dizendo: “eu perdôo e quero tocar a existência de vocês” ou ainda: “eu perdôo e quero caminhar com vocês”, o nome disso é: RECONCILIAÇÃO. Não existe perdão sem a possibilidade de novos encontros. O perdão não é um acordo de paz, que nos põe no stand by em relação ao outro; em que esperamos o primeiro sinal de desacordo ou quebra do protocolo para mais uma vez partirmos para o ataque; como acontece na Faixa de Gaza. Acho perfeito o entendimento de Machado de Assis a esse respeito, quando afirma: "Não levante a espada sobre a cabeça de quem te pediu perdão.” O perdão nos desarma, quebra a resistência dentro de nós e nos move empaticamente em direção ao outro.
    Se você acredita ter perdoado, então você entrou no caminho da reconciliação, da nova partida, do reinício, do encontro. Talvez não seja fácil olhar para os olhos de quem te ofendeu, mas peça emprestados os “olhos de Deus” e enxergue o seu ofensor como Cristo: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.” (Lucas 23.34). Não julgue, perdoe, até por que: "Só quem entende a beleza do perdão pode julgar seus semelhantes." Sócrates.
     Se há significância para a vida, está nos relacionamentos. Então não percorra o caminho da fuga, é covardia e ao mesmo tempo é se furtar do melhor de Deus, que se revela no abraço de um irmão, no sorriso de um pai, no aperto de mão de um amigo, no olhar generoso de uma esposa. Quer viver intensamente: perdoe, reconcilie-se, encontre.

“Nada encoraja tanto ao pecador como o perdão.” William Shakespeare

Pr. Hilquias

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O que Wesley Praticou e Pregou sobre o Dinheiro?

John Wesley pregou muitas vezes sobre o uso do dinheiro. Possuindo provavelmente o maior salário já recebido na Inglaterra, ele teve oportunidades de colocar suas idéias em prática. O que ele disse a respeito do dinheiro? E o que fez com o próprio dinheiro?

John Wesley experimentou uma pobreza opressiva quando criança. Seu pai, Samuel Wesley, era pastor anglicano numa das paróquias que pagavam os menores salários do país. Ele tinha nove filhos para sustentar e raramente ficava sem dívidas. Uma vez John viu seu pai sendo levado para a prisão dos devedores. Portanto, quando seguiu seu pai no ministério, não tinha ilusão alguma acerca das recompensas financeiras.

É provável que tenha sido uma surpresa para John Wesley que, embora Deus o houvesse chamado para mesma vocação de seu pai, não o havia chamado para ser tão pobre quanto ele. Em vez de ser pastor numa paróquia, John sentiu a direção de Deus para ensinar na Universidade de Oxford. Lá, ele foi escolhido para ser membro do conselho do Lincoln College. Sua posição lhe garantia pelo menos trinta libras por ano, mais do que o suficiente para um rapaz solteiro viver. John parecia desfrutar de sua relativa prosperidade. Gastou seu dinheiro em jogos de cartas, tabaco e conhaque.

Enquanto estava em Oxford, um incidente transformou sua perspectiva acerca do dinheiro. Ele havia acabado de comprar alguns quadros para colocar em seu quarto, quando uma das camareiras chegou à sua porta. Era um dia frio de inverno, e ele notou que ela não tinha nada para se proteger, exceto uma capa de linho. Ele enfiou a mão no bolso para dar-lhe algum dinheiro para comprar um casaco, mas percebeu que havia sobrado bem pouco. Imediatamente, ficou perplexo com o pensamento de que Deus não havia se agradado pela forma como havia gasto seu dinheiro. Ele perguntou a si mesmo: O mestre me dirá “Muito bem servo bom e fiel”? Tu adornaste as paredes com o dinheiro que poderia ter protegido essa pobre criatura do frio! Ó justiça! Ó misericórdia! Esses quadros não são o sangue dessa pobre empregada?

O que Wesley fez?

Talvez, como resultado desse incidente, em 1731, Wesley começou a limitar seus gastos para que pudesse ter mais dinheiro para dar aos pobres. Ele registrou que, em determinado ano, sua renda fora de 30 libras, suas despesas, 28, assim, tivera duas libras para dar. No ano seguinte, sua renda dobrou, mas ele continuou administrando seus gastos para viver com 28, desse modo, restaram-lhe 32 libras para dar aos pobres. No terceiro ano, sua renda saltou para 90 libras. Em vez de deixar suas despesas crescerem juntamente com sua renda, ele as manteve em 28 e doou 62 libras. No quarto ano, recebeu 120 libras. Do mesmo modo que antes, suas despesas se mantiveram em 28 libras e, assim, suas doações subiram para 92.

Wesley sentia que o crente não deveria simplesmente dar o dízimo, mas dar toda sua renda excedente, uma vez que já tivesse suprido a família e os credores. Ele cria que com o crescimento da renda, o que deveria aumentar não era o padrão de vida, mas sim o padrão de doações.

Essa prática começou em Oxford e continuou por toda a sua vida. Mesmo quando sua renda ultrapassou mil libras esterlinas, ele viveu de modo simples, doando rapidamente seu dinheiro excedente. Houve um ano em que seu salário superou 1400 libras. Ele viveu com 30 e doou aproximadamente 1400. Por não ter uma família para cuidar, não precisava poupar. Ele tinha medo de acumular tesouros na terra, portanto, seu dinheiro ia para as obras de caridade assim que chegava às suas mãos. Ele registrou que nunca permaneceu com 100 libras.

Wesley limitava suas despesas, não adquirindo coisas que eram tidas como essenciais para um homem de sua posição. Em 1776, os fiscais de impostos inspecionaram suas restituições e lhe escreveram a seguinte sentença: “Não temos dúvidas de que o senhor possui algumas baixelas de prata para cada item que o senhor não declarou até agora”. Eles queriam dizer que um homem proeminente como ele, certamente possuía alguns pratos de prata em sua casa, e o acusavam de sonegação. Wesley lhes respondeu: “Tenho duas colheres de prata em Londres e duas em Bristol. Essa é toda a prata que possuo no momento e não comprarei mais prata alguma, visto que muitos ao meu redor almejam por pão”.

A outra forma pela qual Wesley limitava seus gastos era identificando-se com os pobres. Ele pregava que os crentes deveriam se considerar como membros dos pobres, a quem Deus havia dado dinheiro para ajudá-los. Portanto, ele vivia e comia com os pobres. Sob a liderança de Wesley, a igreja Metodista de Londres estabeleceu dois abrigos para viúvas na cidade. Elas eram sustentadas pelas ofertas recolhidas nos encontros e nas celebrações da Ceia do Senhor. Em 1748, nove viúvas, uma mulher cega e duas crianças viviam ali. Juntamente com elas, vivia John Wesley e outro pregador metodista que se encontrava na cidade naquela ocasião. Wesley se alegrava em comer da mesma comida que elas, à mesma mesa, antevendo o banquete celestial que todos os crentes compartilharão.

Durante quatro anos, a dieta de Wesley consistia principalmente em batatas, em partes para melhorar sua saúde, mas também para economizar dinheiro. Ele dizia: “Aquilo que eu guardo para comprar carne pode alimentar alguém que não possui comida alguma”. Em 1744, Wesley escreveu: “Quando eu morrer, se eu deixar dez libras para trás... você e toda a humanidade poderão testemunhar contra mim, dizendo que tenho vivido e morrido como um ladrão e salteador”. Quando ele morreu em 1791, o único dinheiro que estava em sua posse eram algumas moedas, encontradas em seus bolsos e em sua gaveta de roupas.

O que havia acontecido ao restante do dinheiro que ele ganhara em toda a sua vida, uma quantia estimada em trinta mil libras?[i] Ele o havia doado. Como Wesley havia dito: “Não poderei evitar deixar meus livros para trás quando Deus me chamar, porém minhas próprias mãos executarão a doação de todas as demais coisas”.

O que Wesley Pregou?

O ensino de Wesley sobre o dinheiro oferece diretrizes simples e práticas para qualquer cristão.

A primeira regra de Wesley acerca do dinheiro era “Ganhe o máximo que puder”. Apesar de seu potencial para o mau uso, o dinheiro em si é algo bom. O bem que ele pode fazer é infinito: “Nas mãos dos filhos de Deus, ele é comida para os famintos, água para os sedentos, roupas para os que estão descobertos. Ele dá ao viajante e ao estrangeiro um lugar onde pousar a cabeça. Por meio dele, podemos manter a viúva, no lugar de seu marido, e aos órfãos, no lugar de seu pai. Podemos ser uma defesa para os oprimidos, levar saúde aos doentes e alívio aos que têm dor. Ele pode ser como olhos para o cego, como pés para o coxo e como o socorro para livrar alguém dos portões da morte”!

Wesley acrescenta que ao ganhar o máximo que podem, os crentes devem ser cuidadosos para não prejudicar sua própria alma, mente e corpo ou a alma, mente e corpo de quem quer seja. Desse modo, ele proibiu o ganho de dinheiro em empresas que poluem o meio ambiente ou causam danos aos trabalhadores.

A segunda regra de Wesley para o uso correto do dinheiro era “Poupe o máximo que puder”. Ele insistiu para que seus ouvintes não gastassem dinheiro somente para satisfazer a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida. Ele clamava contra comidas caras, roupas luxuosas e móveis elegantes. “Cortem todas essas despesas! Desprezem as iguarias e a variedade, e estejam contentes com o que a simples natureza requer”.

Wesley tinha duas razões para dizer aos crentes para comprarem somente o necessário. Uma era óbvia: para que não desperdiçassem dinheiro. A segunda era para que seus desejos não aumentassem. O antigo pregador destacou sabiamente que, quando as pessoas gastam dinheiro em coisas que, de fato, não precisam, elas começam a desejar mais coisas das quais não precisam. Em vez de satisfazerem aos seus desejos, elas apenas os fazem aumentar: “Quem dependeria de qualquer coisa para satisfazer esses desejos, se considerasse que satisfazê-los é o mesmo que fazê-los crescer? Nada é mais verdadeiro do que isto: A experiência diária demonstra que quanto mais os satisfazemos, mais eles aumentam”.

Wesley advertiu principalmente sobre a questão de comprarmos muitas coisas para os filhos. Pessoas que raramente gastam dinheiro consigo mesmas podem ser bem mais indulgentes com seus filhos. Ao ensinar o princípio de que gratificar um desejo desnecessariamente tende a intensificá-lo, ele perguntou a esses pais bem-intencionados: “Por que você compraria para eles mais orgulho ou cobiça, mais vaidade, tolice e desejos prejudiciais? ...Por que você teria um gasto extra apenas para trazer-lhes mais tentações e ciladas, e para  transpassá-los com mais tristezas”.

A terceira regra de John Wesley era “Doe o máximo que puder”. A oferta de uma pessoa deve começar com o dízimo. Ele disse àqueles que não dizimavam: “Não há dúvidas de que vocês têm colocado o seu coração no seu ouro”. E advertia: “Isso ‘consumirá sua carne como o fogo’”! Entretanto, a oferta de uma pessoa não deve se limitar ao dízimo. Todo o dinheiro dos crentes pertence a Deus, não apenas a décima parte. Os crentes devem usar 100% de sua renda da forma como Deus direcionar.

E como Deus direciona os crentes a usarem sua renda? Wesley listou quatro prioridades bíblicas:

1. Providencie o que é necessário para você e sua família (1 Tm 5.8). O crente deve estar certo de que sua família possui suas necessidades e comodidades supridas, ou seja, “quantidade suficiente de uma comida modesta e saudável para comer, e roupas adequadas para vestir”. O crente também deve garantir que a família tenha o suficiente para viver caso haja imprevistos em relação ao seu ganha-pão.

2. “Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes” (1 Tm 6.8). Wesley acrescentou que a palavra traduzida para “vestir” é literalmente “cobrir”, o que inclui tanto moradia como roupas. “Conclui-se claramente que tudo o que tivermos além dessas coisas, no sentido empregado pelos apóstolos, é riqueza – tudo quanto estiver além das necessidades, ou no máximo, além das comodidades da vida. Qualquer um que tenha comida suficiente para comer, roupas para vestir, um lugar onde repousar a cabeça, e mais alguma outra coisa, é rico”.

3. Providencie o necessário para “fazer o bem perante todos os homens” (Rm 12.17) e não fique devendo nada a ninguém (Rm 13.8). Wesley disse que a reivindicação pelo dinheiro do crente que se seguia à família era a reivindicação dos credores. Ele acrescentou que aqueles que dirigiam o próprio negócio deveriam ter ferramentas adequadas, estoque ou o capital necessário para manter seu negócio.

4. “Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da família da fé” (Gl 6.10). Após o crente ter provido o necessário para a família, credores e para o próprio negócio, sua próxima obrigação é utilizar todo o dinheiro que sobrou para suprir as necessidades dos outros.

Ao dar esses quatro princípios bíblicos, Wesley reconheceu que algumas situações não são assim tão claras. A forma como os crentes devem usar o dinheiro de Deus nem sempre é óbvia. Por essa razão, ele ofereceu quatro perguntas para ajudar seus ouvintes a decidirem como gastar seu dinheiro:

1. Ao gastar o dinheiro, estou agindo como se o possuísse ou como se fosse o curador de Deus?

2. O que as Escrituras exigem de mim ao gastar o dinheiro dessa maneira?

3. Posso oferecer essa compra como um sacrifício a Deus?

4. Deus me recompensará por esse gasto na ressurreição dos justos?

Finalmente, para um crente que ainda estivesse perplexo, John Wesley sugeriu a seguinte oração antes de realizar uma compra:

“Senhor, tu vês que estou para gastar esta quantia naquela comida, naquela roupa ou naquele móvel. Tu sabes que estou agindo com sinceridade nessa questão; como um mordomo de teus bens; gastando uma porção dele desta maneira, em conformidade com o desígnio que tu tens ao confiá-los a mim. Sabes que faço isso em obediência à tua Palavra, conforme tu ordenas e porque tu o ordenas. Peço-te que isso seja um sacrifício santo e aceitável a Ti, por meio de Jesus Cristo! Dá-me testemunho em mim mesmo de que, por meio desse esforço de amor, serei recompensado quando Tu recompensares a cada homem segundo as suas obras”. Ele estava confiante que qualquer crente de consciência limpa que fizesse essa oração usaria o seu dinheiro com sabedoria.

[i] Essa quantia equivaleria a aproximadamente 30 milhões de dólares hoje.

Charles Edward White


Fonte: editorafiel.com.br